Noite sem Lua

O céu daqui parece uma imensa coleção de cristais cintilantes. Gostaria de ter uma câmera mais potente (sei lá se é “potente” que se diz) pra conseguir captar o desenho lindo delas no céu. Todas as estrelas aparecem aqui, as constelações não se resumem àquelas de maior intensidade no brilho – aparecem nitidamente todas. Dá pra distinguir a Via Láctea sem qualquer esforço numa noite sem luar; garanto que parece que fizeram uma trilha de leite, tamanha a quantidade de pontinhos brilhantes. É um dos meus presentes mais queridos esse céu e suas estrelas, talvez a maior (e melhor) diferença entre viver aqui, em Pedreira, no interior, e viver lá, em São Paulo. O céu de lá tem uma beleza estranha, como quase tudo naquela cidade. Em dias nublados (por conta do tempo chuvoso ou da poluição), as nuvens ganham um tom avermelhado que, combinado com o tom alaranjado das lâmpadas de mercúrio dos postes, cria uma atmosfera que eu adoro: muitas sombras, luz em cima, luz no nível dos olhos… Adoro São Paulo à noite; mas adoro, também, o céu de inverno daqui de Pedreira, especialmente quando ele vem acompanhado de uma Lua nova.
Noites assim, quando o céu se enfeita de uma maneira tão explícita e tão bela, me fazem acreditar na possibilidade de algo bom estar por acontecer. Enchem meu peito de uma esperança boba, meio sem sentido, mas que me anima tanto e que me dá tanta alegria – pelo simples fato de poder ver isso tudo – que não é difícil imaginar um dia novo nascendo e tudo recomeçando, as lutas, as dificuldades, os dissabores, as amarguras… E tudo bem sobre isso.

42?!

Duas notícias sobre planetas nessa semana estranha: Plutão não é mais um dos nossos e Marte, nesse domingo, estaria tão próximo da Terra que ficaria do tamanho da Lua. Se eu fosse um pouco conspiratório pensaria que esses astrônomos são todos eles donos de editoras de livros didáticos. Essa conversa de planeta/não-planeta lhes renderia milhões em reimpressões; não é o caso. Minhas paranóias referem-se a coisas mais corriqueiras, como ficar procurando informações tendenciosas em reportagens de jornais e revistas. Um divertimento que recomendo. A segunda notícia, sobre Marte, não passava de mais uma balela inventada por esse povo da Internet que não tem muito o que fazer. Ele, o planeta, esteve próximo em 2003 (56 milhões de quilômetros: algo como a distância entre São Paulo e, sei lá, Presidente Prudente) e só voltará a aproximar-se em 2020 – ou qualquer coisa assim.
Enquanto leio sobre isso, escuto Volta do Mar, uma banda de post-rock dos Estados Unidos. Os caras tiraram o nome de uma frase de um dos livros do Saramago. Li apenas duas obras do português, portanto, não sei dizer de qual livro saiu o excerto. Ah! Não me pergunte o que é post-rock, senão eu respondo. São músicas imensas, na maior parte das vezes sem letra, cheias de experimentações, muito barulho, alguma repetição, frases no lugar dos títulos, com uma capacidade fantástica de me tirar desse mundo e me fazer passear por uns lugares estranhos. (Você quis saber; eu sei.) Volta do Mar é uma dessas bandas. Há quem chame de vanguarda. Eu sei lá. Post-rock é pretensioso demais. Algumas bandas deviam entender isso e simplesmente parar de tentar. Volta do Mar eu deixo continuar.
Apesar disso, bom, daquilo, eu saí no quintal hoje para procurar Marte-do-tamanho-da-Lua. Ainda não tinha lido a explicação. Vieram me perguntar e eu fui ver. Um amigo até explicou ontem como e por que a coisa toda se daria – algo sobre difração da luz… “bobagem”. Daí eu lhe disse isso – que era bobagem – e ele me mandou tomar cuidado com o meu ceticismo. Disse até que muita gente no meio acadêmico crê nessas coisas (não estou mais falando de Astronomia, mas de Astrologia, e Plutão), mas que elas têm medo de deixar isso transparecer nos trabalhos que apresentam. Não duvido… Ando vendo tanta coisa nova que não me custa dar o benefício da dúvida a uma informação dessas.
Portanto, não se surpreenda se daqui algum tempo os raciocínios vierem acompanhados de cálculos astrológicos, com direito a ascendência astral e tudo mais. Vai ver a explicação de tudo está aí mesmo e não no 42.

Preciso me encontrar (Cartola) Deixe-me ir, precis…

Preciso me encontrar
(Cartola)
Deixe-me ir, preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir pra não chorar
Quero assistir ao sol nascer
Ver as águas dos rios correr
Ouvir os pássaros cantar
Eu quero nascer, quero viver
Deixe-me ir preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir pra não chorar

É uma dor física (o adjetivo é por eu imaginar que existem as dores d’alma, aquelas…). Há tempos ela não aparecia – nos últimos dias, tem-se feito bastante presente. Começa no pulso esquerdo e sobre o braço, chegando perto do cotovelo. Pensando com calma hoje (enquanto ela doía), concluí que seu caminho não respeita uma lógica qualquer. Dói na parte de baixo do braço, onde se vêem veias e os tendões.
Parece que vai rasgando a carne e é aguda, incômoda; impossível não notar que dói. Aparece sempre que me entristeço. Acredito, então, que há tempos não me entristecia como ultimamente. Some como veio, mas sempre deixa a sensação de que há um motivo definido, grave, pungente, resistindo às minhas tentativas de rir pra não chorar.
Odeio não conseguir me controlar. Odeio perder a batalha e ter que admitir, de mim para mim, minha infinita tristeza. Mas é fato, contra o qual argumentos são absolutamente inúteis.

considerações razoáveis

Quando eu me apaixono, imagino poder ser tão livre para o mundo quanto sou para mim mesmo. Especialmente quando estou apaixonado, uma coragem qualquer me invade num rompante e eu quero (imaginando poder fazer assim) dizer ao mundo tudo o que se passa em mim. Sou muito sincero comigo. Sei, parece estranho, mas tente entender. Na maior parte do tempo, estou sozinho, o que me leva a criar verdadeiros monólogos, nos quais exponho para mim mesmo todo o enredo de uma situação, pra depois ir analisando cada pequeno fato. Não minto nem finjo pra mim mesmo; conto-me tudo. Mais alguém faz isso? (Minha cabeça diz que todo mundo.) Fica, então, explicado o mecanismo da minha auto-sinceridade.
Hoje quis explicar ao mundo meus motivos. Quais motivos? Então. Pensei, repensei e acabei concluindo que essa explicação me satisfaria razoavelmente apenas se eu dissesse nomes e tecesse comentários detalhados sobre cada um dos personagens da história. Resolvi não fazer isso.
Vem daí a incrível necessidade quase física de alguém que me ouça. Também não podia ser um alguém qualquer – já que tenho uma imensa preguiça de começar toda a história de novo. Viria muito bem a calhar alguém que conhecesse boa parte da situação – nomes e tudo.
Porque, veja, eu estou apaixonado por uma moça que não gosta de mim, e que, por sua vez, gosta de um dos meus melhores amigos. Ela sabe disso. Ele sabe disso. Eu mesmo fiz questão de aproximá-los pra que eles tivessem uma conversa franca sobre tudo o que vem acontecendo. Aparentemente, eles estão bem. Eu, aparentemente, também. Mas, lembra?, eu costumo ficar muito tempo sozinho; e nesses momentos, não minto pra mim. Então, pra mim, vendo de dentro, pareço muito mal.
Nada que eu não vá superar, claro. O tempo sara tudo; e ainda aproveita pra pôr as coisas de volta em seus devidos lugares. Só estou dizendo por que preciso pôr isso pra fora. É como se esse texto estivesse sendo ditado por mim num divã, pra uma pessoa sentada ao lado que estivesse segurando um pequeno bloco de notas e que de tempos em tempos me assinalasse sua obsequiosa atenção com um “uhum” suspirado.
A diferença é que não preciso pagar por isso. Vê? Mantenho um pouco da sanidade necessária…
Há um bom punhado de dias ela (a moça) vem sendo a mulher mais linda e agradável e espirituosa e incrível do mundo. Hoje, comer pastel com ela na feira-livre, só reforçou essa impressão. Mas o acaso tem das suas. Acredito que ela estaria mais feliz (não que não estivesse, somos bons amigos) se acompanhada do outro personagem dessa novela.
O modo como o cabelo dela não respeitava a ordem imposta pelo elástico que insistia em prendê-lo num rabo-de-cavalo foi absolutamente encantador. Escapavam ao elástico algumas pequenas mexas… Foi quando percebi que permaneço apaixonado, apesar de toda a irracionalidade da opção.

compromisso

Minden emberi lény szabadon születik és egyenlö méltósága és joga van. Az emberek, ésszel és lelkiismerettel bírván, egymással szemben testvéri szellemben kell hogy viseltessenek.(*)

*tosse*
Maldita gripe. Há um bom tempo ela não me pegava de jeito; ainda bem que não tenho aulas a dar nessa semana, sem voz ia ser impossível. Mas, já que estou aqui, não me custa dizer como as coisas têm andado, afinal de contas. Os últimos dias têm contribuído de maneira muito eficaz para o progressivo desencantamento do mundo diante dos meus jovens olhos. “Todo mundo passa por isso” – dizem. Eu não sei. Estou passando; aos trancos. E ao mesmo tempo em que passo por tudo, algumas coisas vão acontecendo pra que eu perceba que, apesar de tudo, devo lutar pra tentar manter em minha vida certos tons da poesia que sempre me moveu diante dos problemas e tal. Já aconteceu muita coisa ruim comigo – como acontece com todos, obviamente – e eu sempre soube sobreviver a elas. Não há de ser mais simples esquecer tudo o que aprendi, do que novamente aprender com o sucedido. Me parece pouco lógico acreditar nisso. Desaprender, desentender, desconstruir… a genialidade está aí, não no contrário. Saber criticar o que está posto e, revendo o “estado-da-arte” das situações, propor saídas. Geralmente fazê-lo balizado pela tal poesia a que aludi ali em cima. Se é fuga, se equivale a descer um pano semi-opaco diante dos obstáculos, pouco me importa, na verdade. Penso que “poetizando” minhas escolhas, vivo mais plenamente. Será que vale mais agir constantemente baseando-nos na racionalidade que nos impõe o Mundo (agora com letra maiúscula)? Também não saberia responder. Mas posso achar – e acho que não. Este deve ser o 20º texto que escrevo nesse tom, meio que condicionando meus pensamentos frenéticos, os acontecimentos recentes (bons ou maus) a um processo inescapável de aprendizado constante. Sempre me ajudaram… Pensamentos frenéticos. E inesgotáveis, aparentemente. Basta acreditar num segundo de paz que tudo recomeça; outros atores, novos fatos, semelhanças incômodas, tudo de novo. Agora mesmo, nesse 2006, meu quinto ano de faculdade (que parecia absolutamente longínquo), tudo o que tenho são dúvidas. (Adoro a palavra espanhola para dúvidas: deudas; pelo som, talvez.) Se você me perguntasse de que se trata esse texto qualquer, em um site qualquer, de uma pessoa qualquer, te diria que é, cheio de dúvidas, um compromisso com o lúdico – de mim, para mim. Acabo de ouvir o húngaro pela primeira vez. Céus, o que isso tem a ver com todo o resto…? Tive a impressão de que o trecho lido em húngaro terminaria na metade do tempo que levou a leitura em português do mesmo trecho. Uma língua rápida, muitos erres, sons sibilantes. Mas eu dizia sobre os dias. Há uma semana atrás revi, quiçá pela 20º vez, meu eterno retorno particular. Uma situação que, pelo visto, há de me acompanhar pelo resto dos meus dias e que se resume na minha impossibilidade para o amor. Grave, não? Talvez “italianamente” grave – ou seja, descarte o exagero. Eu amo. Só não sou amado. Naquele sentido, por favor. Sei de amigos a quem amo e por quem sou amado. Já foi mais difícil passar por tudo, mas a constante repetição e os calos que a larga experiência traz amenizaram as agruras. Tanto assim que estou aqui, agora, escrevendo um texto semelhante a muitos outros que escrevi, me fazendo acreditar que, ainda mais uma vez, devo continuar tentando. Nem tudo são más notícias, oh, não. Os percalços me fizeram rever as minhas prioridades, me deram a chance de redimensionar minha vida e, por conta disso, pude respirar um pouco mais aliviado (a despeito da constipação). Tenho a impressão de que passei a um estado de maior calma – ainda maior do que aquele em que me encontrava até a semana passada quando abri mão mais uma vez de uma menina que me enchia os olhos. Antes dela, eu estava em relativa paz. Depois dela, houve um momento de paz “quentinha” (perdoe-me pelo termo). Agora que já não há mais nada (a não ser as lembranças, minhas companheiras eternas) e passados os dias de crise, me encontro com um alguém diferente. Óbvio, não? A gente vai crescendo. Me descubro ainda apaixonado por línguas, desejando ouvi-las; quero uma faculdade de Filosofia – não para o currículo, mas para dar certa consistência ao que penso saber sobre esse mundo em que vivo –; depois de Pedro de Toledo, me debato pensando em trazer para fora dos muros da universidade todas as teorias geográficas que não consegui pôr em prática lá e fazê-las funcionar, para que mostrem a todos que podem, sim, desavergonhadamente, ser uma alternativa viável para a solução de problemas cotidianos… Enfim, numa palavra: sigo. Não por obrigação, nem achando que esse mundo seja uma grande merda – ainda que eu pudesse dizer. Disposto, apenas.
*tosse*


(*) Artigo 1 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em húngaro (encontrado aqui, Omniglot, um dos meus sites sobre línguas preferidos).

Sei lá…

Todo mundo se sente um pouco escritor quando tem um blog e o leva minimamente a sério (o que constitui um erro grave, levar um blog a sério). Bom, sei lá se todo mundo – eu me sinto. Me preocupo com o que vou colocar aqui, ainda que isso não vá interferir no destino do mundo, mas não gosto quando me obrigo a escrever alguma coisa.

Esse bem podia ser o começo de um texto para uma despedida.

Queria que alguém mais velho, mas não muito mais velho, me dissesse que também passou por esse momento de dúvida absoluta, que se sentiu sem rumo, quase sem chão; que entende quando eu digo que isso não é “frescura”, que sobreviveu às dúvidas e manteve-se firme nas decisões sobre as coisas em volta…

Será que você vai ler? Acho que sim. Você me ensinou (de um jeito fantástico), entre risos e vergonhas, que um caminho de dúvidas talvez seja a nossa única saída, que talvez cultivar certezas nos torna prisioneiros delas – em vários sentidos. Mas nesse momento, preferiria um pouco menos de dúvidas e pouquinho mais de chão firme pra pisar.

Ando confuso a não mais poder.

Líbano

Um protesto (singelo, mas verdadeiro) contra o genocídio que vem sendo praticado neste país por aqueles de quem menos se esperaria tal atitude irracional, criminosa e repulssiva.

Foi injustificável 60 anos atrás; assim como permanece hoje.

pensamentos soltos

De vez em quando são surpresas, uns momentos meio confusos – sem muito por quê. A coisa toda ia caminhando numa direção, de repente é outra (ainda a mesma, no todo, mas diferente nas partes).
Encontro gente antiga e gente nova. Moças. Gente que podia ter ficado feito marca de um tempo, e que ficou, de certa forma, mas que agora volta – e diferente. Foram surpresas.
Surpresa, inclusive, no seguinte: bundas, claro; mas olhos. Eram olhos líquidos, que venceram as bundas. Eu sei que parece rude e sei também que poucos entenderiam mesmo se eu explicasse com calma. Foi um susto perceber que olhos, não bundas.
Me impressionei com a moça que deixava o início da bunda à mostra (o cofre). Roupas tão apertadas, tão justas, tão asfixiantes, que daqui de longe não pareciam nada confortáveis. Precisava ver o esforço dela ao se levantar e ao sentar na cadeira, tentando esconder o tal cofre (inutilmente, claro).
Vírgulas, reticências, uma sensação de descaso com o computador, outra sensação de que ando de saco cheio de tudo, especialmente de gente que se considera imprescindível ao bom caminhar do planeta.
Vi gente morrendo. Morrendo aos poucos e sem saída – a não ser manter uma certa dignidade no morrer. Mudou muita coisa. Tenho vontade de agarrar pelos colarinhos quem não me ouve contando o que eu vi. Bem sei que não adianta. Quem não ouve, quem parece não se importar, é porque não viu. E só se visse mesmo. A experiência que é minha, é só minha – infelizmente.

Inferno astral

Saber da vida alheia anda me incomodando. Acho que daqui pra frente só lerei blogs políticos, escritos por pseudônimos estranhos. Bom, pseudônimos estranhos também andam me irritando sobremaneira.

É difícil não viver a vida alheia quando se tem tanta informação sobre ela. Perceber a freqüência absurda com que isso tem acontecido, me tira do sério.

Preciso de mais férias.